Cirurgias mamárias: cada etapa do cuidado

Quando falamos em cirurgia mamária, é natural que surjam dúvidas e um certo medo do desconhecido. Afinal, o diagnóstico de um câncer de mama mexe profundamente com o corpo e com as emoções. Eu sempre digo às minhas pacientes que a cirurgia é uma parte essencial do tratamento, mas também é uma etapa que pode (e deve) ser planejada com acolhimento, informação e segurança.

De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA) e outras instituições internacionais de referência, como o National Comprehensive Cancer Network (NCCN), o tratamento cirúrgico do câncer de mama deve ser sempre individualizado — levando em conta o tipo de tumor, o tamanho da mama, as condições clínicas da paciente e, principalmente, suas preferências.

Hoje, temos várias opções cirúrgicas, que vão desde a cirurgia conservadora da mama (quando retiramos apenas o tumor e uma margem de segurança ao redor) até as diferentes modalidades de mastectomia, nas quais pode haver preservação da pele e até do complexo aréolo-papilar, dependendo do caso.

Cada técnica tem indicações específicas, vantagens e cuidados no pós-operatório, mas todas compartilham um mesmo propósito: garantir o controle oncológico com o melhor resultado estético e funcional possível. E, felizmente, a medicina evoluiu muito nesse sentido — o que antes era visto apenas como um tratamento mutilante, hoje pode ser também um caminho de reconstrução e ressignificação.


1. Mastectomia simples ou radical modificada

O que é
Remoção cirúrgica completa da mama e complexo areolo papilar (pode ser unilateral ou bilateral), variando desde mastectomia simples até mastectomia radical modificada, quando há necessidade de avaliar/retirar linfonodos axilares.

Quando indicada
Tumores grandes em relação ao volume mamário, multicentricidade (vários focos em quadrantes diferentes), impossibilidade de obter margens negativas após tentativas de conservação da mama, extenso componente in situ, ou por escolha da paciente em contextos clínicos apropriados. Também pode ser opção quando há contraindicação à radioterapia.

Riscos
Dor pós-operatória, necrose de pele, infecção de ferida, hematoma, seroma (acúmulo de líquido), alteração sensorial do tórax, linfedema (inchaço nos braços) se associada a esvaziamento axilar. Complicações gerais (tromboembolismo) são raras, mas possíveis. 

Tempo de recuperação 
* Internação de 24 a 72h, na maioria dos casos.
* Retorno às atividades leves, como trabalhar no computador ou caminhar, em 3 a 4 semanas.
* Atividades mais intensas e retorno total ao trabalho físico podem levar de 4 a 6 semanas, dependendo da técnica e de complicações.
* A recuperação completa, no entanto, pode variar para cada paciente.

Reconstrução
Pode ser imediata (no mesmo ato cirúrgico) ou tardia. Técnicas incluem prótese/expansor (prótese que se coloca vazia e vai enchendo aos poucos para ganhar espaço), retalhos autólogos (retalhos do próprio corpo, como o abdominal ou o músculo das costas) ou combinações. Simetrização da mama contralateral também é opção.

Cuidados pós-cirurgia
• Manter repouso relativo e evitar esforço com o braço do lado operado nas primeiras semanas.

• Não elevar o braço acima da altura do ombro
• Usar o sutiã cirúrgico conforme orientação.
• Fazer curativos diários e observar sinais de infecção.

• Controle de débito dos drenos, se foram colocados.

• Uso de meias elásticas.

• Fisioterapia pode ser indicada para prevenir rigidez e linfedema.



2. Mastectomia preservadora de pele
O que é
Mastectomia que preserva a pele da mama (exceto a incisão cirúrgica). Remove o tecido mamário por baixo da pele e a papila mas mantém o envelope cutâneo, facilitando a reconstrução com melhor resultado estético.

Quando indicada
Quando a retirada do tecido mamário é necessária (por tamanho/tipo do tumor) mas há intenção de reconstrução imediata e quando não há comprometimento cutâneo pelo tumor. Nesse caso, é sempre feita a avaliação individual.

Riscos
Além dos riscos da mastectomia clássica, existe risco maior de necrose da pele preservada, principalmente se houver comorbidades clínicas, como diabetes ou tabagismo, infecção e problemas de cicatrização que podem comprometer a reconstrução.

Tempo de recuperação
Semelhante à mastectomia convencional, mas se houver reconstrução imediata o tempo de recuperação funcional pode ser mais prolongado, de 4 a 8 semanas, conforme a técnica de reconstrução escolhida.

Reconstrução
A mastectomia preservadora de pele facilita a reconstrução imediata com implante ou retalho, pois o envelope cutâneo fica preservado, o que melhora resultados estéticos e simetria.

Cuidados pós-cirurgia
• Evitar compressão direta na área preservada.
• Observar a coloração e a temperatura da pele para prevenir necrose.
• Manter acompanhamento rigoroso nas primeiras semanas se houver reconstrução imediata.

• Controle de débito dos drenos.

• Não elevar os membros superiores acima da altura do ombro.



3. Mastectomia preservadora de pele e complexo aréolo-papilar ou adenectomia
O que é
Como a anterior, mas também preserva o complexo aréolo-papilar (mamilos), retirando só o tecido mamário subjacente. Em alguns casos realiza-se exame da base do mamilo (intraoperatório) e, se necessário, retira-se o complexo (adenectomia).

Quando indicada
Tumores com distância adequada do complexo areolar, sem comprometimento cutâneo ou do mamilo ao exame de imagem e/ou biópsia. É indicada também quando se deseja melhor resultado estético sem comprometer segurança oncológica e nos casos de cirurgia profilática, quando a paciente tem mutação genética que indica a retirada das mamas.

Riscos
Comprometimento vascular do mamilo com necrose parcial/total e risco de reoperação caso as margens venham próximas ou comprometidas. Por isso, a avaliação deve ser bem criteriosa com imagem e/ou biópsia.

Tempo de recuperação
Semelhantes aos da mastectomia preservadora de pele, com retorno às atividades leves entre 2 a 4 semanas. Mas pelo menos 4 semanas até retornar as atividades habituais, como trabalho presencial e atividade física.

Reconstrução
É uma excelente opção quando se planeja reconstrução imediata com melhor resultado estético. Pode ser realizada com prótese imediatamente e, às vezes, é usado o expansor.

Cuidados pós-cirurgia
• Cuidado especial com a irrigação da aréola e do mamilo (evitar compressão da região).
• Evitar tabagismo, pois prejudica a vascularização.

• Controle da glicemia e da pressão.
• Seguir todas as orientações para curativos e mobilidade gradual do braço.



4. Ressecção segmentar/ cirurgia conservadora da mama
O que é
Retirada do tumor com margem de tecido mamário saudável ao redor para preservar a maior parte da mama. Termos correlatos: tumorectomia, segmentectomia, quadrantectomia ou excisão ampliada. A escolha do termo depende do volume retirado.

Quando indicada
A pequenos tumores em relação ao volume da mama, quando é possível obter margens cirúrgicas negativas e a radioterapia complementar está disponível (após cirurgia conservadora, costuma-se indicar radioterapia para reduzir recidiva local). A escolha considera tamanho do tumor, volume mamário, desejo da paciente e resultado estético.

Riscos
Sangramento, infecção, alteração do contorno mamário, assimetria entre as mamas, necessidade ocasional de nova cirurgia se margens estiverem positivas; risco de recidiva local reduzido com radioterapia adequada.

Tempo de recuperação
* Alta no mesmo dia ou em 24 h.
* Retorno às atividades leves em 7 a 14 dias
* Retorno completo em 2 a 4 semanas.
* Radioterapia adjuvante costuma iniciar semanas após cicatrização.

Reconstrução / oncoplastia

Muitas vezes a técnica oncoplástica (associação de cirurgia oncológica e plástica) é usada para melhorar o resultado estético — como remodelação do tecido mamário, redução contralateral para simetria, ou preenchimento local. Caso seja realizado oncoplastica, a recuperação tende a ser mais demorada.

Cuidados pós-cirurgia:
• Cuidar da incisão e evitar impacto na mama até cicatrização completa.
• Radioterapia costuma começar algumas semanas após a recuperação.

• Uso do sutiã cirúrgico para manter a posição da mama sem tração da mesma


5. Biópsia do Linfonodo sentinela
O que é

Procedimento para identificar e remover um ou poucos linfonodos que são os primeiros a drenar linfaticamente o tumor (sentinela). Se o resultado for negativo, evita-se a retirada extensa de linfonodos. É feito com técnica de medicina nuclear, azul de patente ou métodos combinados.

Quando indicada
Em pacientes com tumor invasivo e axila clinicamente negativa. 

Riscos
Geralmente baixa morbidade; risco reduzido de linfedema comparado à dissecção axilar completa; pode haver reação alérgica ao corante, seroma ou infecção.

Tempo de recuperação
* Alta no mesmo dia ou em 24h.
* Retorno às atividades leves em 2 a 3 semanas.

Cuidados pós-cirurgia
• Realizar movimentos leves do ombro para evitar rigidez.
• Observar qualquer sinal de seroma (acúmulo de líquido).



6. Dissecção axilar
O que é
Remoção de vários linfonodos axilares (níveis I–III).

Quando indicada
Em axila clinicamente positiva ou em casos onde a biópsia prévia mostra linfonodos metastáticos e tratamento local exige esvaziamento. As decisões podem variar conforme terapias neoadjuvantes.

Riscos
Maior risco de linfedema (inchaço do braço), limitação de movimento do ombro, parestesia, seroma e infecção. A fisioterapia após o procedimento reduz complicações funcionais.

Tempo de recuperação
* Internação de 1 a 2 dias
* Retorno a atividades leves em 2 a 4 semanas.
* Recuperação funcional total pode levar de 6 a 8 semanas.

Cuidados pós-cirurgia:
• Evitar carregar peso e medir pressão no braço operado.
• Fisioterapia precoce é essencial para preservar a mobilidade.
• Cuidado especial com drenagem linfática e movimentos do braço até 6 a 8 semanas com indicação médica.




Reconstrução mamária


A reconstrução da mama é uma etapa que faz parte do tratamento e não deve ser encarada apenas como um procedimento estético. Ela melhora a autoconfiança, identidade e qualidade de vida após o câncer. A escolha deve ser feita com informação e, acima de tudo, respeito à história e ao corpo de cada mulher.

Ela pode ser feita imediatamente, no mesmo ato da cirurgia mamária para a remoção do câncer, ou de forma tardia, após o término dos outros tratamentos, como quimioterapia ou radioterapia. E o mais importante: toda mulher tem direito à reconstrução mamária pelo
Sistema Único de Saúde (SUS) e também pelos planos de saúde, conforme a Lei nº 9.797/1999.

As principais técnicas de reconstrução mamária são:

Prótese de silicone
Utiliza uma prótese definitiva colocada sob o músculo peitoral. É uma opção simples, com boa recuperação, indicada quando há pele suficiente e de preferência sem radioterapia.

 

Expansor de tecido
Um dispositivo temporário é colocado para expandir gradualmente a pele e o músculo, sendo depois substituído por uma prótese definitiva. Indicado quando não há pele suficiente após a mastectomia.

Retalhos autólogos
Usa tecidos do próprio corpo (como abdômen, costas ou glúteo) para reconstruir a mama. Oferece resultados muito naturais, mas envolve uma cirurgia mais longa e recuperação um pouco mais lenta.

Técnicas combinadas
Associam o uso de retalhos e prótese, aproveitando o melhor de cada método. Indicadas quando se busca maior volume ou quando há necessidade de simetrização com a mama contralateral.



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